Estabelecer rotinas e ensinar um bebé a dormir é uma opção de cada família e envolve quase sempre questões emocionais difíceis de resolver. Ensinar o bebé/criança a dormir pode levá-lo ao choro – e isso é algo que enquanto pais queremos a todo o custo evitar – mas lidar com vários despertares noturnos, não dormindo mais de 2 ou 3h seguidas pode levar a família à ruptura.
Como em todos os assuntos relacionados com maternidade, existe polémica sobre ensinar bebés a dormir. Há muito que pediatras, neurologistas, psicólogos, mães, “sleep trainers” debatem entre si este tema.
Como em quase todas as questões relacionadas com a educação e com o crescimento e desenvolvimento dos mais pequenos, há várias correntes de pensamento. Todas elas apontam os aspectos positivos do que defendem, algo que para mim me parece justo e natural. Se nem com o que pôr na sopa dos bebés há consenso, não poderia haver uma opinião única em relação a algo como o sono!
Quem estuda os ritmos de sono dos mais pequeninos – e quem não dorme e procura soluções – encontra dois lados totalmente distintos.
E é aqui que começa a primeira das falsas questões de quem “demoniza” as pessoas que optam por ensinar os bebés a dormir.
Não existem apenas dois lados de uma moeda. Os métodos de Estivill ou de Ferber ensinam as crianças a dormir através do “choro controlado”: a criança é deitada na sua cama acordada, sem as habituais ajudas (as “muletas” de que eu tanto falo no meu livro) e é deixada a chorar no quarto, sozinha, de forma a auto-confortar-se. Os pais podem entrar no quarto de x em x minutos para falar com o bebé, mas não tocar-lhe, e voltam a sair. E o espaçamento entre as visitas vai tornando-se cada vez maior.
Com uma filosofia oposta encontramos, por exemplo, Elizabeth Pantley com uma abordagem sem lágrimas ao sono dos bebés.
Como mãe comecei, obviamente, por procurar este tipo de ajuda. (Sempre achei os métodos de choro controlado demasiado duros e stressantes tanto para mim como para o meu filho e por isso nunca os coloquei em prática). Infelizmente percebi que este tipo de opções, pelo menos no meu caso, tratavam-se mais de literatura apaziguadora do que de soluções para a privação de sono. E compreendi que para além do “preto” e do “branco” há muitos autores e métodos pelo meio. Foram esses que me chamaram a atenção.
Quem treina (ou ensina) bebés e crianças pequenas a dormir nem sempre o faz através de métodos como o de Estivill ou de Ferber.
Na realidade, a maioria dos defensores do ensino do sono são médicos de renome internacional. Jodi Mindell, por exemplo, médica, especialista de sono e diretora do Centro de Alterações do Sono do Hospital Pediátrico de Filadélfia escreve exatamente sobre esta temática. Explica nos seus livros que uma das causas para os despertares múltiplos durante a noite e para as sestas curtas é exatamente a necessidade que o bebé/criança tem em repetir o uso das “muletas”. E que por isso é importante que o bebé aprenda a confortar-se sozinho. Para isso, ensina uma série de técnicas que ajudam o bebé a relaxar e que permitem que o processo de aprendizagem seja rápido, mas gentil.
Também a Academia Americana de Pediatria sublinha a importância do sono nas crianças e nos bebés e reforça a ideia de independência neste ato fisiológico que parece tão natural e simples, mas que pode transformar as vidas das famílias.
Já Isabela Granic e Marc Lewis, psicólogos de desenvolvimento, incentivam o ensino (ou a tão temida palavra: “treino”) de sono nos bebés e nas crianças, mas com uma vertente que, pessoalmente, me agrada muito. Estes autores têm em conta as transições e grandes mudanças na vida dos nossos bebés, bem como as suas fases de desenvolvimento. Outros especialistas de sono ignoram ansiedades de separação, desenvolvimentos motores ou alterações como mudança de escola, mas eu estou convencida de que estes são factores que podem determinar o sucesso dos pais quando ensinam os seus bebés a dormir.
Também Harvey Karp, o pediatra “amigo dos bebés” que tanto fala de tentarmos recriar o ambiente intra-uterino para os nossos pequeninos e que usa uma série de truques que se popularizaram entre as mães pelo seu sucesso e facilidade, escreve no seu livro “The Happiest Baby Guide to Gentle Sleep” que quando não se consegue que o bebé durma usando as estratégias que indica, recomenda o treino de sono.
Na verdade, este médico indica, inclusivamente, o método de Ferber (sim! o de “choro controlado” que descrevo no início deste texto) ou uma abordagem mais próxima à de Tracey Hogg (“pick up/put down”) em que pegamos no bebé ao colo sempre que este chorar e voltamos a pousa-lo na cama sempre que estiver mais calmo. Uma vez mais… acordado.
A abordagem que fui desenvolvendo ao longo dos anos bebe dos ensinamentos de muitos daqueles médicos, psiquiatras, psicólogos e especialistas que respeito e admiro. Quem leu os meus livros, quem veio às minhas consultas, quem me aborda em palestras ou por mensagens no facebook ou email, sabe e entende que a minha posição relativamente ao treino de sono é algo que adequo à família e que não promovo o choro controlado. Não porque diga que é errado ou certo. Tal como não o digo em relação a bebés que dormem com os pais. Acredito piamente que cada estratégia terá os seus motivos por detrás e as suas consequências, que serão certamente diferentes de acordo com quem as aplica. No meu trabalho defendo que o lugar dos pais é junto dos filhos. Nós devemos estar por perto para os ajudarmos. Para os acalmar. Para lhes darmos beijinhos, palmadinhas, miminhos, festinhas e até colo. E para que o bebé ou a criança acalme é necessária uma preparação. Horários adequados, rotinas relaxantes, tempo de qualidade em família. Se pensar no sono só como o ato de dormir, então a possibilidade de sucesso é muito menor. E é isso que evito fazer.
Mas a verdade no meio disto tudo é que cabe a cada família escolher o que é certo para elas. E que ao menos as “polémicas” servem para que cada vez mais as pessoas fiquem a conhecer que há possibilidade de alterar a forma como se vive o descanso.
Para mim, o descanso dos bebés e das crianças é muito importante. Mas também o descanso das mães (e dos pais). Nunca me pareceu que uma mãe que me procure para ajudar o seu filho a dormir melhor fosse pior mãe. Pelo contrário. O que mais vejo é a vontade de serem melhores mães. Mães com mais paciência, mães mais felizes, mães mais descansadas. E é isso, que na grande maioria das vezes, conseguem.