Todos os anos, em abril, se assinala o Dia Mundial da consciencialização do Autismo, uma condição cada vez mais prevalente a nível global. O autismo enquadra-se numa gama de transtornos do desenvolvimento, que se manifestam ao nível da comunicação, linguagem, comportamento e interação social. Estima-se que seis em cada mil crianças apresente uma perturbação do espectro do autismo, com maior incidência no sexo masculino.
Ao longo dos anos, várias abordagens têm sido adotadas no sentido de estimular o desenvolvimento de crianças com perturbações do espectro do autismo, embora com eficácia limitada. Atualmente, outras estratégias inovadoras, como a aplicação de células estaminais do cordão umbilical, estão a ser investigadas neste contexto. É de destacar o trabalho desenvolvido na Universidade de Duke (EUA), por uma equipa de investigadores liderada pela Dra. Joanne Kurtzberg, prestigiada médica hemato‑oncologista e pioneira em transplantação com sangue do cordão umbilical. Num ensaio clínico de fase 1, cujos resultados foram publicados em 2017, este grupo de investigadores demonstrou que a infusão de sangue do cordão umbilical autólogo (do próprio) era exequível e segura em crianças com perturbações do espectro do autismo. Neste estudo, em que participaram 25 crianças com idades entre os 2 e os 6 anos, aproximadamente 70% das crianças melhorou num ou mais sintomas de autismo. Seguidamente, foi realizado um ensaio clínico de fase 2, em que 56 crianças com perturbações do espectro do autismo receberam uma infusão de sangue do cordão umbilical autólogo, 63 receberam sangue do cordão umbilical alogénico (de um dador que não o próprio) e 61 receberam placebo. Os resultados mostraram melhorias nas capacidades de comunicação e atenção após a infusão, em crianças com idades entre os 4 e os 7 anos sem défice cognitivo. Mais recentemente, o mesmo grupo de investigadores publicou os resultados de um ensaio clínico de fase 1, em que foram testadas as células estaminais do tecido do cordão umbilical para o tratamento de perturbações do espectro do autismo. Num total de 12 crianças, metade demonstrou melhorias em pelo menos duas das três medidas de eficácia analisadas. Os resultados dos estudos efetuados indicam que estas melhorias serão devidas ao aumento da conectividade cerebral observado após a infusão de células estaminais.
Globalmente, a infusão de células estaminais do sangue e do tecido do cordão umbilical foi considerada segura e bem tolerada, e esteve associada a melhorias na sintomatologia em crianças com perturbações do espectro do autismo sem défice cognitivo. Tendo em conta estes resultados positivos, a agência reguladora americana Food and Drug Administration aprovou a realização de um ensaio clínico sob a denominação “expanded access”, sob o qual o centro médico da Universidade de Duke está autorizado a tratar crianças e jovens adultos (até aos 26 anos) com perturbações do espectro do autismo, entre outros problemas do foro neurológico, usando sangue do cordão umbilical do próprio ou de um irmão compatível, que se encontre armazenado num banco familiar de células estaminais. Duas crianças com perturbações do espectro autista foram já tratadas, no centro médico da Universidade de Duke, com o seu próprio sangue do cordão umbilical, armazenado à nascença na Crioestaminal.
Atualmente, contam-se já mais de 500 crianças e jovens adultos com perturbações do espectro do autismo que foram tratados com células estaminais do sangue ou do tecido do cordão umbilical, em contexto experimental. Embora este método de tratamento ainda não esteja disponível de forma generalizada na prática clínica corrente, os resultados têm sido promissores. A continuação da investigação clínica nesta área poderá conduzir à adoção do tratamento com células estaminais como uma terapia adjuvante, capaz de complementar as abordagens convencionais atualmente utilizadas para facilitar o desenvolvimento destas crianças.