Com mais 30 anos de utilização clínica, o sangue do cordão umbilical tem-se estabelecido como uma alternativa à medula óssea, tornando a transplantação hematopoiética acessível a um maior número de doentes, quer crianças quer adultos. Segundo dados da European Society for Blood and Marrow Transplantation, em 2021, mais de 50% dos transplantes de sangue do cordão umbilical realizados na Europa foram em adultos. Sendo os resultados dos transplantes de sangue do cordão umbilical comparáveis aos de medula óssea, o sangue do cordão umbilical apresenta algumas vantagens, entre elas: a colheita fácil e indolor; a disponibilidade imediata para transplante; a maior tolerância nos fatores de histocompatibilidade; e o menor risco de doença do enxerto contra o hospedeiro, uma complicação grave e potencialmente fatal que pode ocorrer após o transplante. O grande desafio da transplantação com sangue do cordão umbilical prende-se com a quantidade limitada de células de algumas amostras, o que tem sido ultrapassado recorrendo a duas unidades de sangue do cordão ou à multiplicação das células, em laboratório (expansão celular), antes do transplante. Esta abordagem tem permitido obter resultados muito positivos em ensaios clínicos. Uma das metodologias de expansão das células do sangue do cordão umbilical, em laboratório, concluiu ensaios clínicos de fase 3, com resultados favoráveis, tendo sido possível aumentar 130 vezes, em média, o número de células, o que permitiu uma rápida recuperação hematológica (12 dias, em média), associada a menor incidência de infeções e menor tempo de hospitalização após o transplante. A agência norte‑americana do medicamento (FDA) aprovou o produto de terapia celular que resulta desta expansão de sangue do cordão umbilical (denominado Omisirge®) em abril de 2023. Com a aprovação desta terapia celular, uma unidade de sangue do cordão umbilical que não tiver a dose celular necessária para um transplante poderá ser expandida em laboratório de modo a ser obtida a quantidade de células necessária para o doente em causa.
A colheita e criopreservação de sangue do cordão umbilical são hoje prática comum. Estima-se que, em todo o mundo, estejam disponíveis mais de 800 mil unidades de sangue do cordão umbilical armazenadas em bancos públicos, e mais de seis milhões de unidades em cerca de 200 bancos privados. Desde o primeiro transplante em 1988, foram já realizados mais de 60.000 transplantes de sangue do cordão umbilical, em crianças e adultos, para o tratamento de mais de 90 doenças, principalmente doenças malignas do sangue, como leucemias e linfomas, mas também imunodeficiências, anemias e doenças metabólicas, tendo nos últimos 10 anos sido realizados cerca de metade destes transplantes. Nos últimos anos, o número de novas aplicações terapêuticas do sangue do cordão umbilical em investigação tem aumentado, tendo já sido incluídos mais de 800 doentes em estudos clínicos. Um dos avanços mais importantes na área da medicina regenerativa com sangue do cordão umbilical, nos últimos anos, foi a descoberta de que a administração de sangue do cordão umbilical a crianças com paralisia cerebral está associada a melhorias na função motora decorrentes do aumento da conectividade cerebral total, observada após infusão de sangue do cordão umbilical. Para além da importância do sangue do cordão umbilical no contexto da transplantação hematopoiética, a sua crescente utilização em novas aplicações clínicas vem reforçar o valor terapêutico desta fonte de células estaminais.